quarta-feira, 15 de junho de 2011

FERNANDO PESSOA, SALAZAR E O ESTADO NOVO

Durante muitos anos, o nacionalismo do Poeta da Mensagem foi confundido com o “nacionalismo” de António de Oliveira Salazar.


Nada mais errado, de acordo com os textos divulgados por vários estudiosos, com destaque para Joel Serrão, Teresa Rita Lopes e Teresa Sobral Cunha.


Só agora aprecem num só volume os textos dispersos por livros e revistas, neste Fernando Pessoa, Salazar e o Estado Novo. Da autoria do Poeta nacionalista, com introdução e notas explicativas sobre os 5 poemas e 3 dezenas de comentários em prosa. E se alguém tinha dúvidas sobre o anti-salazarismopessoano deverá perdê-las, assim como em torno de outras ideias políticas, tema que será ampliado com o Dicionário de Política.


Com o título de Ensaios Políticos (Ideias para a reforma da Política Portuguesa) (s/d), o escritor “Petrus” (pseudônimo de Pedro Veiga) divulgou num livro de 166 páginas 4 trabalhos que Fernando Pessoa subscrevera em várias publicações, abstraindo, é claro, dos textos políticos que a censura cortaria e que só agora puderam aparecer – “Petrus” foi um pioneiro dos estudos sobre o criador dos heterônimos, ao lado de João Gaspar Simões, Adolfo Casais Monteiro, Agostinho da Silva, Jorge de Sena, António Quadros, Teresa Rita Lopes, Joel Serrão, Eduardo Lourenço e outros.


É certo que as ideias políticas de Pessoa somente puderam ser conhecidas com o fim da censura em Portugal, fazendo cair a máscara dos que o aparentavam ao fascismo. No fundo, os poemas da Mensagem tinham tanto a ver com o regime como Os Lusíadas de Camões, obras que eram frequentemente identificadas com o salazarismo – confusão habitual entre os defensores das ditaduras. É claro que Pessoa esteve ausente da solenidade em que lhe atribuíram o “Prêmio Antero de Quental”, instituído pelo governo e foi galardoado pelo “melhor poema”.Havia duas modalidades, a do livro (com 100 páginas, no mínimo) e a do poema, e Mensagem contava não mais de 98!


O véu começou a ser desvendado com a edição, em 1978, do volume DaRepública (1910-1935), apresentado e organizado por Joel Serrão, e do Pessoa Inédito (1993), de Teresa Rita Lopes, e de vários textos revelados por António Quadros e Teresa Sobral Cunha, entre outros. Na verdade, tanto em relação a Pessoa como a tantos escritores é a soma de contribuições que conta.


Foi assim que selecionamos, além dos 5 poemas, mais 5 textos em prosa, divulgados por Joel Serrão, os 15 escolhidos por Teresa Rita Lopes e 1 por Teresa Sobral Cunha, graças aos quais concluiremos que condição nacionalista de Fernando Pessoa nada tinha a ver com Salazar e a Ditadura, que começou por ser militar (1926) e depois fascista, sob a capa do Corporativismo (após 1933). Indiscutivelmente, os documentos ora reunidos definem o pensamento pessoano perante o regime ditatorial e as suas consequências políticas, econômicas, sociais e culturais.


Há pormenores que merecem ser salientados e abrimos com a carta de 1935 (em Pessoa Inédito vêm mais 5 breves cartas de Fernando Pessoa ao mesmo destinatário – o Presidente da República, General Oscar Carmona – mas que não chegaram a ser enviadas). Declarando-se autor dos poemas nacionalistas de Mensagem e do artigo “Associações Secretas” (Diário de Lisboa, 9-2-1935), na condição de “templário”, pondera Pessoa, na 1ª carta, que a Ditadura em Portugal percorreu 3 fases:


1) “A de simples defesa própria e da expectativa (28-5-1926) até à chegada do Professor Oliveira Salazar ao Ministério das Finanças” (23-4-1928);


2) Veio depois a fase da consolidação da ditadura “pela ação enérgica, paciente e cuidadosa” de Salazar (“equilíbrio dos orçamentos e por outros efeitos análogos ou similares”);


3) A fase seguinte “começou por afirmar-se no Integralismo Monárquico disfarçado do Estado Novo” e continuou pelo Estado Corporativo até que o regime se tornou “integralmente integral, isto é, francamente inimigo de duas coisas: da dignidade do Homem e da liberdade do Estado”. Por fim, Salazar impôs diretrizes: “Até aqui a ditadura não tinha tido o impudor de, renegando toda a verdadeira política do espírito acima da política – por intimar quem pensa a que pense pela cabeça do Estado, que a não tem, ou de vir a intimar a quem trabalha a que trabalhe livremente como lhe mandam”.


A seguir, o escritor cataloga Salazar entre os dominicanos, e não de feição jesuítica: “Ele é minucioso, mas não é sutil: tem astúcia, mas não diplomacia; não tendo nem encanto nem maleabilidade, é incapaz de captação direta ou indireta. Se o seu aspecto duro e manhoso lhe valeu, como definição fisionômica, esse epíteto frequente, conviria sugerir aos autores de (…) que a palavra ‘seminarista’ é uma fotografia muito mais exata do ditador português.” E prossegue o retrato psicológico: “Inteligente sem maleabilidade, religioso sem espiritualidade, ascético sem misticismo, este homem é de fato um produto de uma fusão de estreitezas. A alma campestre sórdida do camponês de Santa Comba se alargou em pequenez pela educação do seminário, por todo o inumanismo livresco de Coimbra, pela especialização rígida do seu destino desejado de professor de Finanças. É um materialista católico (há muitos), um ateu nato que respeita a Virgem.”


Salazar é um incapaz, opina o intelectual Fernando Pessoa: “Para governar um país como chefe, falta-lhe, além de qualidades próprias que fazem diretamente, num chefe, a qualidade primordial – a imaginação. Ele sabe talvez prever, ele não sabe imaginar. Ele mesmo mostrou desdém por aquilo a que chamou “os sonhadores nostálgicos do abatimento e da decadência” (discurso de 21-2-1935); Na realidade, “a frase de Salazar, mesmo que tenha esta origem sordidamente instintiva, é ainda mais infeliz do que parece. O Ditador dirigia-se a escritores e a poetas, era a eles que ordenava não sonharem. Ou ele quer que os escritores portugueses escrevam sempre sem pensar ou quer que nas suas obras não figure nada que seja sonho. Só se fará, portanto, em Portugal, poemas ou romances sobre as coisas materiais da vida. Salazar, aqui, revela-se um Zola.”


O Poeta não perdoa o sacrilégio cultural: “Em Salazar há sempre o materialista, o contabilistazinho. Não se pode sonhar porque o sonho não é remunerável. Não se deve sonhar porque nos arriscamos a enganar quando sonhamos diante de uma operação aritmética”. E joga mais uma farpa, interrogando: “E esse Mussolini que Salazar tanto admira, será que a saudade do Império romano não tem nada a ver com o seu ímpeto e a sua bravura?”


Salazar copia as ditaduras, porém à sua maneira, vaidoso que espera os parabéns, isto é, o apoio, mesmo que não seja honesto. Que elogiem o governo! O Poeta não aceita submeter-se: “Como naturalmente é de todo impossível que seja que homem for esteja sempre de acordo com qualquer outro que seja, resulta daí que me devo curvar como escravo integral, louvando por profissão e diariamente, ou que só devo publicar um artigo quando estiver de acordo com a ação do governo, não dizendo nada nos casos contrários. A solução natural ‘é nada publicar’ – ou, como aconteceu no inverno fascista, escrever para a gaveta…”


Desiludido, dirá ao Presidente da República que os discursos ditatoriais “não são maneiras de falar”, pois “o que torna Salazar odioso ao povo é que ele encarna a supressão de toda a liberdade pública – de falar, de escrever, de se reunir”. Os portugueses estavam no beco sem saída: “Em conclusão a Ditadura Portuguesa só se mantém por duas razões – o medo do comunismo e a insubstitubilidade de Salazar. Não são, é certo, aspectos fortes no campo moral, tanto mais que são negativos, mas talvez sejam bastante fortes no campo estritamente material e prático. É ainda o alcoolismo sociológico”, isto é, o eventual sucessor de Salazar “não saberia abolir a censura nem estabelecer as outras liberdades”…


O grande equívoco”


É com este título que Teresa Rita Lopes abre os 19 textos do Pessoa Inédito, incluindo as 6 cartas ao Presidente da República e 2 poemas, num dos quais (com data de 1932) Fernando Pessoa dizia que Salazar era “um cadáver emotivo, artificialismo organizado pela propaganda”. E três anos mais tarde condenava a “cesarização de um contabilista”, acrescentando: “O Chefe do Governo não é um estadista: é um arrumador”.


Em outro documento nem o considerava “um financeiro”, além de seguir a linha “dogmática e intolerante” de certos católicos. Exemplificava que, com a chamada revolta da Ilha da Madeira (2-7-1932), Salazar “mudou o rumo da Ditadura”, imitando o golpe de Primo de Rivera e aproximando-se de Mussolini. Aliás, os regimes nazi-fascistas são igualmente comentados: “Mussolini e Hitler agarram-se à absoluta banalidade das suas ideias [e são-no...] de outro modo. Salazar, incontestavelmente mais inteligente do que qualquer um deles, quer ter ideias e é aí que se perde no disparate e na contradição. Também ele só tem ideias banais, mas são banais a um nível mais elevado. Hitler e Mussolini têm ideias banais de homem do povo; Salazar tem ideias banais de homem culto. Acontece-lhe o que os ingleses chamam ‘cair entre dois bancos’: a sua banalidade não toca o povo porque é de origem cultural, repugna às elites, porque é banalidade”.


Teresa Rita Lopes divulga mais as 6 cartas (todas datadas de 1935) ao Presidente da República e na 1ª o Poeta elogia o democrata António José de Almeida pela sua “eloquência”, assim como Sidónio Pais (que foi assassinado por desordeiros políticos), enquanto na carta seguinte proclama que o ditador é “incompetente para o cargo que assumiu”. Na 3ª sublinha que o discurso sobre os prêmios literários “enxovalha todos os escritores portugueses – muitos deles seus superiores intelectuais com a fútil imposição de ‘diretrizes’ que ninguém poderia aceitar por não compreender quais sejam” (…), chamando-lhe “aldeão letrado” e incapaz de governar “uma república aristocrática”.


Acresce que o ditador não passa de “executor de ideias de outrem, visto que as não as tem próprias, de secretário de prestígio alheio. Porque não o pode conquistar” (referência possível ao jornalista e escritor António Ferro, que foi ligado ao movimento modernista e Salazar nomeou Secretário da Propaganda Nacional). E fustiga depois: o “chefe” assumiu a “posição, presentemente mais que régia, da Presidência do Conselho. / Realmente, é um Estado Novo, porque este estado de coisas nunca antes se viu.” Finalmente, na 6ª carta, Pessoa entende que “passou a época da desordem e da má administração; temos boa administração e ordem. E não há nenhum de nós que não tenha saudade da desordem e da má administração.”


O que mais protestar sem liberdade, mas com censura? Para alguns, Oliveira Salazar era indiscutível e, por isso, Fernando Pessoa (por volta de 1933) concluiu ironicamente – “Mais valia publicar um decreto-lei que rezasse assim”:


“Art. 1 A(ntonio) d(e) O(liveira) S(alazar) é Deus.”


“Art. 2. Fica revogado tudo em contrário e nomeadamente a Bíblia”.


E o Poeta afirma que deste modo ficaria instituído “o autêntico Estado Novo – a Teocracia pessoal” e, por acréscimo, “o sovietismo direitista da U(nião) N(acional).”


Os erros de Salazar


No capítulo que rotulou de “Interregno-II”, apresenta Joel Serrão alguns textos que são também essenciais para a compreensão do que pensava Fernando Pessoa do regime salazarista.


Observa-se que, em 1928, o escritor publicara Interregno – Defesa e Justificação da Ditadura Militar em Portugal: o alvo eram as desordens políticas nas ruas e a desordem financeira no governo. Quem o condenará pelo que escreveu e pensavam os portugueses, naquele tempo? Está fora de dúvida que os resultados econômico-financeiros, desde a chegada de António de Oliveira Salazar ao poder, foram bem aceitos. Ele começara a arrumar o que era preciso, mas foi preparando simultaneamente a sua instalação no poder, que perdurou por mais de quatro decênios.


Muito antes de 1935, o autor de Mensagem (que morreu em 30 de novembro deste ano) arrependera-se das boas perspectivas que augurara, mas nada poderia fazer – Salazar era apoiado não somente pela maioria dos militares mas também pelos numerosos civis que, por convicção ou interesse, viram no ditador que despontara a solução para os males nacionais. Em 1935, com o “Interregno-II”, Pessoa admitiu o engano: “Escrevi no princípio de 1928 um folheto com o mesmo título que o presente (…). Dou hoje esse título por não escrito; escrevo este para o substituir”.


Explicou ainda: “Quando escrevi o outro folheto, em fins de 1927, estávamos ainda longe do Estado Novo e da nova Constituição, embora já perto, sem que o soubéssemos, da vinda e primeira fase de Salazar. Havia de fato interregno, isto é, a Ditadura era, propriamente, uma Ditadura de interregno. Com a votação da nova Constituição estávamos já num regime: o Interregno cessou. Nada importaria, ou importa, o julgar mau o Estado Novo. Existe. O Interregno cessou”.


Entretanto, há outros pontos de vista pessoanos que vale a pena relembrar:


1) “É, a meu ver, um erro de Salazar o filiar o espírito de partido – pelo menos entre nós e nos países latinos – na aprendizagem de arguir e defender que se faz ou faria em certas escolas.”


2) Doutrina estadonovista: “(…) não me proponho discutir a nova Constituição ou o Estado Corporativo; a ambos aceito, por disciplina; de ambos discordo, porque não concordo.”


3) O Poeta nacionalista não crê na “admiração” que o salazarismo estava despertando no mundo e salienta: “O prestígio de Salazar não se deriva da sua obra financeira, tanto porque, sendo essa obra uma obra de especialidade, o público não tem competência, nem pretende ter competência, para a compreender. Como porque o acolhimento calorosamente favorável, que essa obra teve, denotava já um prestígio anterior. O prestígio de Salazar nasceu vagamente da sugestão do seu prestígio universitário e particular, mas firmou-se junto do público, logo desde as suas primeiras fases como ministro, e as suas primeiras ações como administrador, por um fenômeno psíquico simples de compreender.”


4) As Ditaduras Militar e a de Salazar foram comparadas por Fernando Pessoa: “Há razões para supor (…) que dois terços do país estão com a Ditadura Militar. O que não há razão para supor é que os mesmos dois terços do país, ou qualquer coisa que se pareça com esses dois terços, esteja com o Integralismo Lusitano, cujos princípios, aliás estrangeiros, se nos querem impor como soma de ciência social e necessária condição nossa, pelo Manifesto do Governo e o Relatório Salazar.”


Outras considerações do autor de Mensagem poderiam ser aduzidas, a partir dos livros de Teresa Rita Lopes e de Joel Serrão, entre outros, para justificar o seu desacordo com o pretenso nacionalismo do regime fascista português. Mas as passagens transcritas são mais do que suficientes para ilustrar o principal – Fernando Pessoa não tinha nada a ver com o totalitarismo salazarista. E se quisermos concluir temos de recorrer à sua autobiografia de 30-3-1935:


Ideologia política: Considera que o sistema monárquico será o mais próprio para uma nação organicamente imperial como é Portugal. Considera, ao mesmo tempo, a Monarquia completamente inviável em Portugal. Por isso, a haver um plebiscito entre regimes votaria, embora com pena, pela República. Conservador de tipo inglês, isto é, liberal dentro do conservadorismo, e absolutamente anti-reacionário.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Estudos Pessoanos: O “PADRE MATTOS” NÃO FOI HETERÔNIMO


Entre os 127 heterônimos enumerados por José Paulo Cavalcanti Filho, no livro Fernando Pessoa – uma quase autobiografia (1), pelo menos um existiu humanamente –o “Padre Mattos”, que nasceu no dia 7 de Janeiro de 1893 na aldeia de Folques (Arganil, Portugal), onde morreu em 11 de Dezembro de 1916. Seu nome completo: José Lourenço de Matos.

Foi sacerdote e jornalista (publicou artigos em mais de uma dezena de jornais e 7 livros, incluindo O Baluarte de um Vencido (póstumo) e O Paraíso do Cristão (“endereçado especialmente à juventude feminina”). Monárquico por excelência, combateu com vigor os excessos anticatólicos da primeira República, mas era tido como pessoa correcta, como fez António José de Almeida, então ministro da Justiça (devia conhecer bem o Padre Mattos, pois eram ambos da Beira-Serra), e por isso o dirigente republicano mandou escoltar o sacerdote, quando ele foi preso e deportado (!) por suas convicções religiosas, porque os mais agitados ameaçavam agredi-lo.

No livrinho Fernando Pessoa na Beira-Serra (2), dissemos que o Pe. Mattos era muito combativo, mas nem por isso se pode considerar democrática a violência dos seus adversários, que destruíram a pequena tipografia do jornal Manhãs Dominicais (saiu apenas o 1º número...) Com efeito, se a ditadura estadonovista foi inadmissível, as perseguições religiosas durante a Republica foram também imperdoáveis.

Admitimos que, na condição de jornalista, o Padre Mattos foi demasiadamente agressivo nas suas diatribes contra o regime implantado em 5 de Outubro de 1910 – e é sabido que numerosos republicanos discordaram das violências dos contendores, Fernando Pessoa entrou na corrente e atacou-o rudemente, no poema satírico “Origem metaphisica do Padre Mattos, divulgado por Teresa Rita Lopes no 2º volume (3), cuja fonte não é citada por José Paulo Cavalcanti, que se limita reproduzir 4 versos do poeta (pág 377), apontando-o mais tarde entre os heterônimos (pág. 387). Em resumo o “Padre Mattos” não foi nenhum dos múltiplos heterônimos pessoanos – era sacerdote e jornalista e teve o nome verdadeiro de José Lourenço de Mattos. E conheço o seu retrato.

Na sua notável biografia, esclarece o correcto pesquisador José Blanco: “Poema satírico de Fernando Pessoa contra o Padre José Lourenço de Mattos. In Com. Ling. Port., 16, 2ª. Série, 7/2001, pp. 18-22. {Com. ao VII Encontro Internacional do Centro de Estudos Fernando Pessoa, realizado em São Paulo em 5/18-20/2001} No poema satírico “Origem metafísica do Padre Mattos”, FP, talvez irritado com o excessivo reaccionarismo monárquico do Padre José Lourenço de Mattos, jornalista de “A Palavra”, foi além das marcas: É um texto “malcriadíssimo”.’ (4)

Depois da leitura do poema transcrito por Teresa Rita Lopes, consultamo-la, mas ela não sabia quem era o Pe. Mattos. Continuamos a busca e concluímos que só podia ser o Padre José Lourenço de Mattos, o virulento contestador do regime republicano. E assim chegamos ao artigo da revista Comunidades de Língua Portuguesa (nº16, São Paulo, 2001) que desenvolvemos no livro Fernando Pessoa na Beira-Serra ed. Dinalivro, Lisboa, 2003). Com a devida vênia, só nos falta republicar agora o poema Origem metaphysica do Padre Mattos, de Fernando Pessoa:

Bibliografia:

(1) Editora Record, Rio de Janeiro, 2011,

(2) Ed. Dinalivro, Lisboa, 2003

(3) Ed. Estampa, Lisboa, 1990

(4) Ed. Assírio & Alvim, Lisboa, 2008

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Artigo: A. NEVES E SOUSA, O PINTOR E POETA NO EXÍLIO

Foram milhares os portugueses que se refugiaram no Brasil, no decorrer dos séculos, antes e depois da independência, em 1822, entre os quais pintor e poeta A. Neves e Sousa que ainda recentemente foi por isso recordado nas páginas do Jornal de Arganil, região de que era oriundo, embora nascido em Matosinhos e criado em Angola, onde se tornou pintor e poeta. Não obstante, foi cidadão do mundo, pois andou expondo a sua obra pictural através do mundo, com relevo para os países de idioma português.



Nasceu em 25 de Janeiro de 1921 e morreu em São Salvador da Bahia de Todos os Santos (Brasil), onde viveu (exilado) os últimos anos da sua vida. Vários dos grandes episódios da sua carreira foram lembrados pelo Prof. Eng. J. E. Mendes foram citados no referido artigo do semanário, sobretudo nas ligações com a vila de Coja, onde terá pintado pessoas e paisagens, algumas das quais estão hoje com o Engº João de Oliveira e provavelmente com outras famílias da Beira Serra. Daí, a pergunta: não seria possível reproduzi-las no formato de postais? É que são raras as reproduções das obras de grandes artistas plásticos sobre figuras, montes e vales, rios e ribeiras ou igrejas e capelas com imagens sacras que valeria a pena facilitar o acesso e a popularização de pinturas, desenhos e outras ilustrações dispersas por colecções privadas ou guardadas nos belos templos das três Beiras. Ninguém que conheça o catálogo da exposição de Arte Sacra organizada em 1991 pelo Prof. Dr. João de Castro Nunes perde o seu tempo. E o mesmo se dirá das belíssimas esculturas das igrejas de Góis e de Oliveira do Hospital. Há obras de arte muito valiosas espalhadas pelos municípios da Beira Serra, conforme testemunham os estudos do Padre António Nogueira Gonçalves e Regina Anacleto. Ainda não sabemos tudo da igreja e dos mosteiros de Lorvão e de Folques. Há os óleos de Guilherme Filipe em Fajão e noutros lugares. E com Nuno Mata apresentaremos muito em breve o Álbum de Monsenhor A. Nunes Pereira, com meia centena de gentes e paisagens beirãs, resgatadas dos jornais e de outras fontes.



Começamos a falar do Poeta e Pintor oriundo Beira Serra considerando que ele foi um dos milhares de portugueses contemporâneo que acharam no Brasil o seu país de exílio (admite-se que mais de 200 mil portugueses, angolanos e moçambicanos se refugiaram no território brasileiro), perseguidos pelos vitoriosos do “25 de Abril” – e muitos deles regressaram a Portugal, embora não deva esquecer-se que milhares de compatriotas escaparam do jugo fascista durante a longa noite da opressão salazarista. O pintor Albano Neves e Sousa foi uma das vítimas do autoritarismo “moscovita” que sucedeu ao “santa combadense”.



Dirão agora os acomodados que estamos exagerando e a estes respondemos com as palavras do artista exilado Albano Neves e Sousa, no pórtico do seu livro de poesia, publicado em 1991: “As coisas que eu não conseguia transmitir pintando, eu as transformava em poesia e, a terra e eu, éramos uma só idéia. – Fazendo um retrospecto acho que cantei a África de todas as maneiras que sabia e algumas que não sabia...- Quando, por circuntâncias alheias à minha vontade, me vi separado dela, procurei um clima parecido para cultivar a minha saudade.- Então, Angola passou a ser uma coisa íntima e secreta como uma doença. – E, como já não vivo nela, afinal vive ela em mim!”.

terça-feira, 26 de abril de 2011

Convite: Exibição de “Amália – o Filme”


O Centro de Estudos Luís de Camões, órgão cultural do Clube Português, tem o prazer de convidar V. Exª. e Exmª. Família para assistir à projeção do filme português Amália – O Filme de Carlos Coelho da Silva, direção de produção de Gerardo Fernandes.

Apresentação da escritora e professora universitária Raquel Naveira – a sessão integrará as comemorações do Descobrimento do Brasil.

Exibição do filme, 27/4/2011 às 19h30.

Após o filme, será servido um “cocktail”, oferecido pela Diretoria do Clube Português e pelo Moreno’S Buffet.

Prestigie a reunião com sua presença e convide os seus Amigos

Entrada franca

E-mail: centrodeestudosluisdecamoes@clubeportuguessp.com.br

Rua Turiassu, 59 - Tel: 3663-5953

terça-feira, 19 de abril de 2011

“A COMARCA”, “ARGANILIA” E “A COMARQUINHA”

Toda a História se baseia em documentos – e tudo o resto é conversa fiada. Repetir o que nos disse o amigo nada vale se não tiver uma base documental. Já lemos uma série de “estórias” sobre a Imprensa que nem merecem a catalogação. Ainda recentemente, um pretenso “estoriador” classificou como jornal uma revista da emigração: quer dizer, ele nem viu a publicação, mas certamente ouviu dizer...

O que se passa no jornalismo da emigração acontece também com freqüência na área regional. E na “grande imprensa” nem se fala, pois o hábito é ignorar a Província. Foi com o intuito de discutir a questão que a revista Arganilia tentou estabelecer o primeiro inventário da Imprensa da Beira Serra (nº 12, ano 2000, Lisboa). Foram reunidos mais de uma dezena de autores, cada um versando livremente o seu tema, mas o “inventário” contou apenas com dois trabalhos sobre o tema – Bosquejo histórico da Imprensa Arganilense, de Regina Anacleto, e outro da nossa autoria, Subsídios para o Inventário da Imprensa Arganilense.

Mais tarde, ampliámos o nosso estudo: Para a História dos Jornais e Revistas Arganilenses (nº 20 de Arganilia, ano 2006), e recentemente alargámos a série com mais 3 artigos na “Comarca” restaurada, depois da desastrosa falência da empresa e do período vazio entre 10 de junho de 2009 e 23 de dezembro de 2010, o que significa que, tendo aparecido em 1 de janeiro de 1901, as edições ainda não somaram 111 anos. Talvez as datas não tenham grande importância, porém os historiadores estarão perfeitamente informados.

Entretanto, a nova A Comarca de Arganil reapareceu e os seus mais antigos colaboradores sentem-se concerteza recompensados, apesar do longo hiato de quase um ano e meio. Aliás, pouco há a acrescentar à História coordenada pela escritora Regina Anacleto, malgrado as falhas de atenção a certos participantes, entre os quais apontamos António Lopes Machado, redactor, durante meio século, em Lisboa do jornal centenário que em boa hora passou a dirigir.

Remetendo-nos à História dos 100 anos, limitar-nos-emos a mencionar a relação estabelecida sob a autoridade de Regina Anacleto com sobre os diretores/editores do periódico, desde o 1º número, em 1-1-1901:

1) 1901-1904 A. J. Rodrigues, proprietário e editor responsável;

2) 1905: Francisco Ignácio Dias Nogueira, director, e António A. B. Gama editor;

3) 1906: Francisco Ignácio Dias Nogueira, director, António A. B. Gama e F. Gomes Júnior. Editores;

4) 1907: Francisco Ignácio Dias Nogueira, director, e F. Gomes Junior, editor;

5) 1908-1909: Francisco Ignácio Dias Nogueira, director;

6) 1910: Francisco Ignácio Dias Nogueira, director, e Eugénio Moreira, diretor e administrador, que se manteve na direcção do jornal até 1942, e veio a ser substituído por A. Lopes da Costa no cargo de director efectivo; 1943-1955 posição que só deixou de exercer quando foi substituído em 1958 por João Castanheira Nunes. De 1982 a 1999 a direcção plena do jornal foi assegurada por Francisco Carvalho da Cruz, que teve Jorge Moreira no cargo, no ano 2000, até 2009, quando a empresa proprietária do jornal, requereu a falência.

A revista “Arganilia” e “A Comarquinha”

A revista “Arganilia” publicou o seu primeiro numero no 2º semestre de 1992 e o seu propósito foi o de abordar os temas culturais da Beira-Serra. O titulo foi inspirado, em 1912, pelo então jovem jornalista, escritor e diplomata Alberto da Veiga Simões, que não realizou o projecto por ter sido nomeado Cônsul de Portugal em Manaus. Porém, o seu espírito motivou-nos ao lançamento da publicação 70 anos mais tarde.

Estão publicados 23 volumes que destacam não só a obra de Veiga Simões mais também as do poeta Brás Garcia Mascarenhas, Visconde de Sanches de Frias, José Simões Dias, Condessa das Canas, Prof. Padre Antonio Nogueira Gonçalves, Conselheiro Albino de Abranches Freire de Figueiredo, Monsenhor Augusto Nunes Pereira, Dr. Fernando Vale, Prof. Dr. Marcelo Caetano e Profª Drª. Regina Anacleto. Paralelamente foram editados volumes sobre Arganil, Góis, Pampilhosa da Serra, Poiares, Coja, Oliveira do Hospital e Lousã, assim como nºs. dedicados à imprensa Arganilensse e ao ensino.

Trata-se de uma publicação que já reúne uma boa parte de estudos sobre o patrimônio cultural da Beira-Serra. A larga maioria das edições foi dirigida por nós e por António Lopes Machado. É a primeira revista da nossa região, o que tem provocado inúmeras tentativas de utilização de pessoas não autorizadas, do ponto de vista intelectual. Não obstante, os seus mentores pretendem continuá-la, tanto mais que aspectos importantes do patrimônio histórico-cultural da região estão dispersos ou ainda não foram analisados.

Quanto ao suplemento infanto juvenil “A Comarquinha” foi durante 16 anos um caderno de “A Comarca de Arganil”, sendo o ultimo volume de 03 de dezembro de 2008. Foram publicados 216 números, tratando de assuntos de feição regional, especialmente para os jovens. O seu propósito foi sempre o de despertar o interesse das crianças e dos adolescentes pela leitura da “A Comarca” de amanhã.

Com este quarto artigo sobre a imprensa arganilense, concluímos por agora nossa pesquisa e os nossos comentários acerca de um tema sempre atual e não aprofundado até hoje.

sexta-feira, 11 de março de 2011

Temas Beirões: JOÃO BRANDÃO E O PAPEL POLÍTICO QUE TEVE NA GUERRA CIVIL DA BEIRA (1832-1834)


Disse Fernando Pessoa que “o mito é o nada que é tudo” e esta definição pode aplicar-se à lenda que surgiu em torno da vida de João Victor da Silva Brandão (1825-1880).

Na verdade, o mito surge e alastra a partir de uma “história de fundo lendário” que se desenvolve desde criança e por vezes vai até à idade adulta, conforme sustenta Fernando Ilharco: “a tendência constitucional para a mentira, para forjar acontecimentos imaginários (fabulação) e para simular estados orgânicos anormais simulados. É uma disposição muitas vezes hereditária e mais freqüente na mulher”

Entretanto, deixemos o mito e recordemos que João Victor nasceu e cresceu num ambiente que vai desde a participação do seu pai nas lutas liberais que assinalaram o cerco do Porto até à actividade guerrilheira travada pelos beirões (que na maioria dos casos terão sido contrários ao autoritarismo do Rei D. Miguel). E se ultrapassarmos o tempo, teremos de convir que havia guerrilheiros de ambos os lados – e não de um só! Não obstante, a lenda formou-se preferencialmente em torno de João Brandão, como se os tiros não fossem também disparados pelos miguelistas, apesar de serem conhecidas às violências desferidas contra inúmeros liberais, de acordo com os testemunhos daqueles que sobreviveram à tragédia que abalou quase toda a região, com destaque para a Beira-Serra. E da profusa documentação em jornais e revistas destacamos agora o volume “Apontamentos da vida de João Brandão por ele escritos nas prisões do Limoeiro envolvendo a História da Beira desde 1834”

Para lá das informações do autor, que descreve os acontecimentos que viveu de perto, salientamos a “Relação dos ferimentos e mortes praticados na Província da Beira, desde 1834”: foram 235 mortos, incluindo 21 abatidos pelas forças da ordem (militares e guardas civis), além de 13 sacerdotes e seus familiares, bem como 6 assassinatos atribuídos à guerrilha de Agostinho Vaz Pato e de muitos outros pequenos grupos e pessoas, nalguns casos identificados. De um lado, aponta-se a cooperação das “forças da ordem” absolutistas e, paralelamente, a violência contra os padres, vários dos quais estiveram presos em virtude das suas idéias liberais.

Deduz-se de todos estes esclarecimentos que as intervenções de João Brandão não foram as de um bandido vulgar, mas, sim, as de um político militante, que seguiu o liberalismo de seu Pai, combatendo sempre o autoritarismo absolutista; Se cometeu os excessos dos guerrilheiros, os dos miguelistas não foram menores, embora “o mito que é tudo” haja resvalado para o defensor da Rainha (que nunca deixou de apoiar os beirões liberais).

Segundo revela o professor José Manuel Sobral, que prefaciou a 2ª.edição dos

Apontamentos da vida de João Brandão”, o “mito” que beneficiou os adversários de João Victor da Silva Brandão era romântico, porém falso, mas vingou ao ponto de se transformar numa espécie de “hino” dos cantores cegos e provincianos de Lisboa e de aldeias, anunciando os “crimes” de J. B. e a sentença injusta do tribunal de Tábua que o condenou ao degredo em Angola (o júri era formado por um Vaz Pato e por diversos inimigos políticos). E o mito virou lenda, que também nós escutámos em criança, sem entender as origens da tragédia da guerra civil da Beira-Serra).

Muito mais é preciso contar e documentar acerca do liberal indomado de Midões. Insisto neste ponto para honrar a memória do meu avô paterno (que era “midoense” e nada teve com a ideologia de João Brandão), mas insurjo-me contra o julgamento inadmissível de quem o condenou ao degredo, sabendo que até em Angola foi ilegalmente perseguido e roubado, à sombra de um absolutismo ditatorial. Assassinado covardemente por um militar criminoso, depois de morto degolaram-no e mandaram a cabeça ao governador ignóbil...

Acusado pelos miguelistas retardados, os povos de Catumbela (entre o Lobito e Benguela) ergueram-lhe um rústico monumento do jardim público, agradecendo não só a fundação da importante Companhia Agrícola Cassequel, mas também as condições de trabalho dos seus colaboradores. Há cerca de trinta anos visitei esse jardim público – com o Padre e jornalista José Vicente - e fui agradavelmente surpreendido com a existência do monumento em memória de João Brandão: havia um resguardo de vidro com dezenas de cartas de admiradores anônimos exaltando as qualidades de trabalho e de apoio recebidas do benfeitor de Midões.

quinta-feira, 10 de março de 2011

Brasil: A DIVULGAÇÃO DA CULTURA PORTUGUESA ATRAVÉS DAS ASS0CIAÇÕES LUSO-BRASILEIRAS


Com cerca de 170 agremiações espalhadas por todo o vastíssimo território brasileiro, o papel que têm cumprido na divulgação da Cultura Portuguesa ainda não foi devidamente avaliado pelos especialistas nem tão pouco pelos governantes dos dois paises que costumam atravessar o Atlântico mais pela devoção turística do que ao serviço dos reais interesses de Portugal e Brasil.

As associações lusobrasileiras, cujo pioneirismo foi inaugurado pelo Real Gabinete Português de Leitura, em 1837, no Rio de Janeiro, têm feito mais pela Cultura Portuguesa do que todos os políticos seja ele qual ele for. Num passado já remoto, lembramos dois estadistas portugueses que tentaram estimular a aproximação de Portugal e Brasil - o Rei D.Carlos, que preparava a sua visita quando foi barbaramente assassinado, juntamente com o filho mais velho, e o Presidente da República, António José de Almeida, que em 1922 veio participar das comemorações do centenário da independência. E os outros reis e presidentes que fizeram – e neste capítulo incluímos os dirigentes dos dois lados, perguntamos o que é que eles fizeram para que portugueses e brasileiros possam unir-se na construção de um futuro comum. Que responda quem souber!

Às associações de espírito lusíada no Brasil já devemos bastante assim como ressaltamos alguns intelectuais e artistas lusos, entre os quais apontamos as obras de Hipólito José da Costa, João Lúcio de Azevedo, Raphael Bordallo Pinheiro e dos contemporâneos Gilberto Freyre, Jaime Cortesão, Pedro Calmon, Ferreira de Castro, Miguel Torga, Serafim Leite e de tantos outros!

Do ponto de vista associativo, o Clube Português passou a ter, desde 1920, uma posição de relevo, no plano cultural, mas, nos últimos decênios anos, foi dos que mais se ressentiu, em São Paulo, da queda do surto emigratório e apenas na presidência de Rui Mota e Costa a crise econômico-financeira foi debelada. Uma nova fase cultural começou em 2010 com a mesa - redonda, coordenada pela escritora Teresa Rita Lopes (da Universidade Nova de Lisboa) e a participação de professores e escritores brasileiros e portugueses, em torno de “As idéias políticas de Fernando Pessoa”, desmentindo que o poeta da Mensagem fosse um mero seguidor do regime fascista. E não o foi, conforme revelaram os documentos do livro Fernando Pessoa, Salazar e o Estado Novo, assim como as conclusões do debate (em 14-7-2010), no Clube Português, nas comemorações, no Brasil, do 75º aniversário da morte de criador dos heterônimos.

Um livro foi lançado – 90 anos do Clube Português, sob a coordenação do Centro de Estudos Luís de Camões (órgão cultural da entidade), e nesse volume de 160 páginas reunimos os principais episódios da história da agremiação luso-paulistana, desde 1920 até hoje. Foram recolhidos depoimentos daqueles que têm acompanhado a vida associativa e vão continuar a fortalecê-la enquanto puderem. O volume reúne dezenas de manuscritos e fotografias dos fundadores e colaboradores dos principais acontecimentos, testemunhando o muito que fizeram pela dignificação cultural da Nação Portuguesa no Brasil e da receptividade da acção que tiveram e que ainda cumprem no país irmão. Por fim, vale a pena ressaltar que o espírito lusíada do Clube Português de São Paulo tem como símbolos os dois maiores poetas de Portugal de ontem e de sempre - Luís de Camões e Fernando Pessoa!

terça-feira, 1 de março de 2011

TERRAS DA BEIRA SERRA

Sacerdote, artista plástico, poeta, historiador, folclorista e ensaísta, Monsenhor Augusto Nunes Pereira foi um dos mais notáveis intelectuais contemporâneos da Beira Serra. A sua obra é vasta e do melhor nível cultural.

Desenhador, gravador e pintor, realizou numerosas exposições de arte em Portugal, no Brasil e no Luxemburgo, ao mesmo tempo que foram divulgados dezenas de trabalhos em inúmeros periódicos, com relevo para “A Comarca de Arganil”, “Correio de Coimbra”, “Jornal de Arganil”, revistas “ Mensageiro de Santo António” e “Arganilia” (que lhe dedicou uma edição especial), etc. E, entre outras obras consagradas ao Padre-Artista de Mata de Fajão, assinalamos os volumes Monsenhor Nunes Pereira – o percurso de uma vida (por Maria da Conceição Oliveira e José Maria Pimentel), Encontro com Poetas e um Artista / Mons. Nunes Pereira (por Mário Simões Dias) e O vitral da Ressurreição da Igreja Paroquial de São José de Coimbra (por Marco Daniel Duarte).

Para lá das pessoas, o pintor fixou igualmente montes e vales, santos e anjos, rios e árvores dos lugarejos, aldeias e vilas, enfim tudo o que dá à Beira as suas características inconfundíveis que o artista não se cansou de desenhar e pintar, na pedra, na madeira, no cobre ou ferro. Não sabemos de ninguém que tenha ido tão longe, recriando as gentes e paisagens das nossas terras que parecem não ter fim. Tudo o interessou e continua a interessar-nos, quer estejamos perto ou aos milhares de pessoas que partem do país natal e que ainda vivem com as imagens da sua terra nos olhos e no coração: as imagens e os sentimentos são tão reais como se estivéssemos no meio dos pinhais, olivais e vinhedos, rios ou nos caminhos perdidos nos montes.

As paisagens cheias de vida de Nunes Pereira são aquelas que permanecem sempre dentro de nós – e por isso as fomos guardando e colecionando. Assim fiz eu e assim fez Nuno Mata que buscamos os traços do artista até que decidimos reuni-los e recordá-los num livro que poderemos reviver ao longo dos anos.

O álbum Terras da Beira Serra junta uma boa cinquentena de ilustrações e quem sabe poderá ser aumentado, um dia, se nos for possível descobrir mais algumas que permanecem dispersas, mas as que são agora reimpressas dão uma idéia segura da Beira voltada da Estrela para Coimbra e admitimos que se trata de uma perspectiva ampla. São visões humanas e da Natureza, redescobrindo a História da região através das obras de arte, dos templos e monumentos, os ricos solares e as casas rústicas da nossa terra. Os costumes e as lendas estão também presentes nos homens e mulheres. Redescobrem-se os Santuários do Montalto e da Senhora das Preces, a capelinha longínqua do Colcurinho e de outros lugares sacros, por todos amados e poetizados, relevando-se a beleza dos rios Alva e Ceira, assim como das ribeiras e dos ribeirinhos, dos matos indevassáveis e das múltiplas flores silvestres que enfeitam os caminhos, os chafarizes e fontenários, as igrejas e capelas quase escondidas nas montanhas, os frutos saborosos dos castanheiros, macieiras e pereiras, pessegueiros e figueiras, uvas, etc., etc.

O pintor A. Nunes Pereira faz-nos reviver as estações do ano, recorda as mulheres, os meninos e os homens, desenhando como se compusesse música, cantando-nos as modinhas simples e harmoniosas da nossa infância, reproduzindo o vento e a chuva, o frio e o sol beirão, as festas e romarias, as danças e os cantares que já não se vêem nem escutam. Mas o que pertence ao passado permanece vivo nos desenhos, gravuras e pinturas das terras da Beira Serra. É como se relêssemos as poesias de Brás Garcia Mascarenhas, D. Luís da Silveira, de Simões Dias, do Visconde Sanches de Frias ou de Vasco de Campos e do próprio Nunes Pereira.

Nos versos dos nossos Poetas e nas pinturas do sacerdote que veio da Mata de Fajão devem ser admiradas as vilas e aldeias da nossa Terra e é por isso que dizemos que nas Terras da Beira Serra estão as raízes e a eternidade do nosso passado, cada vez mais presente e na esperança do amanhã. Abrindo os olhos, ficaremos deslumbrados com as ilustrações que ele recriou para testemunhar a vida dos nossos ancestrais e dos que hoje a continuam e hão de perpetuar-nos no futuro.

(*) Escritor português há muitos anos radicado no Brasil, João Alves das Neves é co-autor (com Nuno Mata) do álbum Terras da Beira-Serra, que será lançado em breve.

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Imprensa: PARA A HISTÓRIA DOS JORNAIS E REVISTAS ARGANILENSES

Depois do artigo sobre o Museu da Imprensa Regional e das Comunidades de Língua Portuguesa (23-12-2010), pretendemos acrescentar outros comentários em torno da História da Imprensa de Arganil, a partir do que escreveu o dr. A.J.de Vasconcelos, pioneiro do regionalismo da Beira Serra e um dos principais doutrinadores do Movimento.

No texto que publicou no Livro de Ouro do XXV aniversário da Casa da Comarca de Arganil, em 1954, está uma extensa lista da Imprensa de Arganil, Góis e Pampilhosa da Serra: o total é de 24 títulos, mas temos de considerar que nem todos são periódicos, pois vários deles foram números únicos, como são os casos do “Fraternidade” (1888), “Manhãs Dominicais” (1911), “O Regedor” (1914) e “A Voz dos Rouxinóis” (1946) – é claro que nos referimos tão somente aos arganilenses.

De outro lado, incluímos 2 suplementos infantis de “A Comarca”: “O Jornalito”, porque teve 6 edições, e “O Bebé“, dirigido pelo jornalista Luís Ferreira. No estudo que apresentou na revista “Arganilia” (2006) esclarece Regina Anacleto (da Universidade de Coimbra) que “O Jornalito” foi uma brincadeira do pai da “directora” (que era menor), mas “O Bebé” foi dirigido por um jornalista profissional” que trabalhava no jornal lisboeta “O Século” e que depois se tornou um dos mais assíduos redactores de “A Comarca” : enquanto o primeiro suplemento foi efêmero, “O Bebé” durou de 1-1-1930 até 23-12-1932. Não obstante, o mais duradouro dos suplementos infanto-juvenis da centenária “Comarca” foi “A Comarquinha”, que tivemos o prazer de coordenar no decurso de 16 anos, desde 3 de Janeiro de 1991 até 3 de Dezembro de 2008, completando 216 edições mensais.

Voltamos a falar do Livro de Ouro da Casa da Comarca de Arganil para recordar que se tratou de um projecto do Dr. Álvaro Marques Afonso, que o dirigiu após deixar a presidência da instituição. E um dos seus mais próximos colaboradores foi o Dr. Armando José de Vasconcelos Carvalho, o mais entusiasta regionalista que conhecemos de perto. Aliás, o volume deve ser considerado a mais genuína “Bíblia” do Regionalismo da Beira-Serra, pois reuniu alguns dos destacados cultores do Movimento que lutou pelo progresso material e cultural da Beira.

Antes de concluir o nosso segundo artigo acerca da Imprensa de Arganil (quem se habilita a fazer o historial do jornalismo goiense, pampilhosense e dos outros municípios beirões – pelo menos o dos que ficam no lado de cá da Serra de Estrela, é necessário relembrar a iniciativa da revista cultural “Arganilia” (tão injustamente atacada por quem nada fez pela nossa Terra). Referimo-nos, evidentemente, ao Colóquio da Imprensa, realizado em Lisboa, que contou não somente com a nossa colaboração, mas também com os depoimentos de Monsenhor A. Nunes Pereira, Regina Anacleto, José Caldeira, António Ramos de Almeida, Aníbal Pacheco, Lina Maria Alves Madeira, Teodoro Antunes Mendes, J. E. Mendes Ferrão, António Lopes Machado, Beatriz Alcântara, Cáceres Monteiro e Fernando Correia da Silva.

Entre as conclusões do I Colóquio da Imprensa da Beira Serra, ressalta-se o propósito de promover em 1991 o II Encontro, durante o qual poderiam ser ampliados os temas da imprensa e outros que abordassem igualmente as questões em aberto do Movimento Regionalista e os de História, Literatura, Folclore e Artesanato, Música, Arquitectura e Artes Plásticas, Economia, etc. Por não se ter concretizado o II Colóquio, quem assume - agora - o desafio?

Na realidade, nem sequer se esgotou o tema da Imprensa, actualizado com a restauração de “A Comarca de Arganil”. Quanto a nós, retomaremos o assunto, comentando as publicações periódicas:

  1. O Trovão da Beira (1871)
  2. Folha Verde (1890)
  3. A Comarca de Arganil (1901)
  4. O Franco Liberal (1905)
  5. Jornal de Arganil (1913)
  6. O Crítico (1914)
  7. Correio de Arganil (1915)
  8. O Celavisense (1916)
  9. O Celavisense (1920),
  10. O Crítico (1921)
  11. O Crítico (1922)
  12. Jornal de Arganil (1926)
  13. Acção ao Regional (1931)
  14. Arganilia (revista cultural da Beira Serra)

A “Revista Arganilia” NÃO irá acabar !!

E-mail enviado a Directora do “Jornal de Arganil” em resposta a noticia publicada em 04/01 sobre o suposto fim da “Revista Arganilia”.

Prezada Senhora Directora:

Venho pedir a divulgação do seguinte esclarecimento:

1. Respondi de boa fé à pergunta que me fez sobre a revista cultural “Arganilia”, pois não sabia que seriam feitos comentários por 2 notórios inimigos meus com os quais não mantenho nenhuns contactos;

2. Confirmo que declarei à Directora do “Jornal de Arganil” que devido à doença do Director e do Vice-diretor a revista estava suspensa temporariamente;

3. Espero que esta minha nota seja publicada, conforme determina a Lei da Imprensa, pois fui injuriado pelos meus dois inimigos.

Sem outro assunto de momento, subscrevemo-nos.

Atenciosamente.

João Alves das Neves

www.joaoalvesdasneves.blogspot.com ou www.revistalusofonia.wordpress.com